segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Getsêmani

Momento antes da sua crucificação Jesus se reúne com os seus discípulos e, com a sua alma angustiada pede para que eles esperem enquanto se afasta para orar (Mt26:36-46). Levando com ele três dos seus discípulos, entre eles Pedro, sente-se angustiado. Ele sabia o que estava para acontecer, sabia que teria que passar por momentos torturantes, não pelas chibatadas que iria levar, nem pelo peso da cruz que iria carregar, mas pelos nossos pecados que sobre si o separavam do Pai. Cristo e o Pai são um, então, a dor era mútua, a dor era intensa e intensificada pelo fato de nunca terem estado separados.

Ele carregou a cruz, sobre si levou os nossos pecados, foi morto pelos nossos dolos, o castigo que nos trouxe a vida eterna estava sobre Ele. Foi essa a Sua opção, nos substituir na cruz, tomar o nosso lugar na morte, separar-se do Pai por um momento para que a vida eterna fosse transmitida como um dom para todo aquele que Nele acreditasse (ar).

Sempre teremos que morrer para que a vida brote em outros corações. Para que o sangue de Cristo circule nas veias e artérias dos nossos pares se faz necessário a renuncia, o deixar de lado o nosso “EU” para que o “NOSSO” se manifeste. Uma linda história circula na internet, ela fala de um menino que é consultado para saber se gostaria de doar sangue para a sua irmãzinha que estava doente. Ele pensou, pensou e disse que sim, doaria o sangue. Ao começarem os procedimentos de retirada o menino pergunta para o medico: Doutor eu vou demorar muito para morrer? Eu vou sentir que estou morrendo? Moral da história, o menino pensou que iriam tirar todo o seu sangue para dar à sua irmãzinha e assim ele teria que escolher entre salva-la e morrer, ou viver e perdê-la. Para que Cristo se manifeste em nós e haja frutificação, nem sempre precisaremos morrer literalmente, mas espiritualmente e isso começa na renuncia do nosso eu, no carregar a cruz.

Ainda podemos citar o exemplo de dois jovens moravianos que foram como escravos, pregar o evangelho a uma população africana de 3000 escravizados. Estes jovens se venderam e com o dinheiro que receberam por suas vidas, financiaram os custos da viagem. Ao serem indagados o por quê de tal atitude, eles responderam: “para que o Cordeiro que foi imolado receba a recompensa por seu sacrifício através das nossas vidas.”

Na Bíblia encontramos vários exemplos de renuncia, porém gostaríamos de citar apenas três. Abraão, conhecido como o Pai da fé foi um grande exemplo de renuncia. Primeiro ele deixou a sua casa e a sua parentela, pegou as suas malas, colocou-as sob os braços e saiu em busca de um lugar que não sabia o qual, nem onde, todavia sabia que aconteceria e o encontraria. Para renunciar primeiramente precisamos acreditar. Uma vez me perguntei: Como Abraão sai de casa assim, sem mais nem menos? Um dia entendi que nos tempos antigos, quando ainda não havia escrita, as histórias eram transmitidas de geração a geração através do que era falado, ou seja, tradicionalmente toda a história dos antepassados era transmitida oralmente. Então comecei a entender que Abraão tinha recebido oralmente, através do que os seus pais falavam, toda a história de Adão/Eva e assim por diante. Portanto, Abraão teria uma base, teria algo para alicerçar a sua fé. Ele simplesmente não surgiu do nada, mas em meio à desvirtualização, a uma sociedade que esqueceu do seu Deus criador, Abraão emerge como um homem que faz a diferença, que percebe que o seu povo estava totalmente enganado, assim decide seguir ao Deus verdadeiro e deixando a sua terra em direção ao lugar onde Deus o ordenou.

Abraão renuncia a sua terra, deixa os seus pais e assim vai cumprir o seu chamado. Posteriormente ele é pego de surpresa ao receber o pedido de Deus em relação ao seu filho Isaque. Mais uma vez ele tem que renunciar àquilo que lhe era mais importante, o filho da sua velhice. Ele é provado e aprovado em sua fé ao oferecer seu herdeiro como sacrifício a Deus em seu coração. Ele prova que o primeiro lugar em seu coração, em sua vida, é de Jeová.

Outro exemplo de renuncia é o de João Batista, o predecessor de Jesus Cristo. A voz que clamava no deserto anunciando o batismo para o arrependimento, aquele que veio para preparar o caminho do Senhor. João, filho de Ana, primo de Jesus, decide viver no deserto, comendo gafanhotos e mel silvestre. Para muitos um louco, mas ele sabia da sua missão, ele tinha a convicção do seu chamado a ponto de ser classificado por Jesus como o maior entre os nascidos de mulher (Mt 11:11). João batista, a voz que clama no deserto. Porém o que nos chama atenção é algo que a bíblia não relata, os sentimentos da sua mãe, Ana, irmã de Maria. O que passaria pela sua cabeça ao ver que seu filho, gerado em seu ventre, estava morando no deserto e se alimentado de forma tão diferente? Ou Ana entenderia a missão do seu filho e aceitaria ou morreria de tanto sofrer ao perceber tal situação. Já parou para pesar nisso?

Mas o maior exemplo de renuncia foi o que primeiro citamos, o exemplo do Deus Pai ao enviar o Deus filho para morrer em nosso lugar, sendo ainda nós pecadores (Rm 5:8). Como poderíamos entender esse amor? Como poderíamos viver tamanha grandeza? Seríamos capazes de fazer algo similar, parecido? Quem morreria no lugar de uma boa pessoa, por exemplo, quem tomaria o lugar de Zilda Arns? (Falo isso devido a sua perceptível e inquestionável dedicação ao próximo, mesmo sabendo que todos descendemos de Adão, pecadores, por isso dependemos da fé no Cristo para salvação). Até que por uma pessoa assim surgissem alguns voluntários, porém acreditamos que por um viciado, ladrão, arrogante, egocêntrico, não haveria candidatos.

Quantas vezes passamos pelo Getsêmani? Temos passado por pequenos getsêmanis diariamente, pelo menos até que a imagem de Cristo seja aperfeiçoada em nós?
A dor de Jesus o levou a uma tristeza que só se transformaria em alegria após ter cumprido a sua missão. Será que essa missão já terminou? Será que Ele não sofre até hoje ao ver os perdidos, ao perceber pessoas com fome e sem ter o que comer, com sede e sem ter o que beber, nuas e sem ter o que vestir? Será que essa missão não continua em nós e devemos renunciar a cada dia o nosso eu, carregar a nossa cruz e segui-lo? A nossa oração reflete um cristocêntrismo – “Todavia não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres”, ou egocêntrismo – “Venha a mim o Teu reino e seja feita a minha vontade”? Temos dito “Senhor eis-me aqui ou Senhor venha aqui”?
Se não clamarmos as pedras clamarão, portanto, antes nós às pedras! (Lc 19:40) Temos renunciado um dia na semana, uma manhã ou uma noite? Isso nos deixa com a consciência tranqüila?

Que a nossa oração diária seja: “Senhor eis-me aqui, faça em mim o teu querer e que se realize a Tua vontade nesta vida que a ti clama. Que as minhas escolhas diárias sejam de acordo com o teu coração, pois quero estar sempre no centro da Tua vontade. Que realmente o Teu reino venha a nós, o Teu senhorio sobre as nossas vidas, pois o meu maior desejo é que o meu eu desapareça para que o Teu espírito se manifeste a cada dia através de mim ou através das pessoas que amo, sim Deus, renuncio não somente a mim, mas também aos meus por amor a Ti, pois sei que nas Tuas mãos eles estarão bem guardados.”

Que Deus os abençoe em nome de Jesus, o nome que está sobre todo nome!

Alcindo Rocha – Cidão... sempre dulos.

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